Resultado final do processo seletivo de escolha de bolsistas CBAE 2018

 

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Comunicamos a todos os participantes dos processos seletivos de escolha de bolsistas do CBAE que os aprovados foram:

 

Iniciação Científica – Lígia Maria Monteiro Santos

Desenvolvimento Tecnológico – Fernanda Raquel Abreu Silva

Pós-Doutorado – José Carlos Matos Pereira

 

Agradecemos a todos pela participação e informamos que os currículos dos demais candidatos foram arquivados para futuros processos de seleção.

Nota de Falecimento | Beatriz Heredia

 

O Colégio Brasileiro de Altos Estudos, com profundo pesar, comunica o falecimento de sua vice-diretora, Beatriz Heredia. Argentina da cidade de Santa Fé, Beatriz naturalizou-se brasileira e trouxe relevantes contribuições acadêmicas para a Antropologia nos dois países.

Formada em História pela Universidad Nacional de Córdoba em 1964, refugiou-se no Brasil em meio à ditadura do Terrorismo de Estado que afligiu a República Argentina nos anos 70 e 80. Ao chegar ao Brasil, foi acolhida pelo grupo de pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional da UFRJ. Ali, cursou mestrado, doutorado e, posteriormente, tornou-se professora do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ.

Sua trajetória tanto pessoal quanto acadêmica sempre teve a marca da luta política. Beatriz notabilizou-se pelos seus estudos nas áreas do campesinato, movimentos sociais, família, antropologia da política e meio ambiente. Nos últimos anos coordenou o Programa de Memória dos Movimentos Sociais (Memov) do CBAE/UFRJ.

 

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Beatriz Heredia em atividade organizada pelo CBAE no IFCS, em março de 2016

 

Segue abaixo moção de pesar aprovada pelo Conselho Universitário da UFRJ:

Moção de pesar do Conselho Universitário da UFRJ pelo falecimento da Professora Beatriz Heredia

É com imensa tristeza que comunicamos a perda de Beatriz Maria Alásia de Heredia, professora e lutadora exemplar pelos ideais acadêmicos, científicos e humanistas da UFRJ.

Beatriz era professora e pesquisadora de Antropologia no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da UFRJ, onde entrou por concurso em 1979, foi chefe de departamento, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia do IFCS e representante em conselhos superiores da UFRJ. Era vice-diretora do Colégio Brasileiro de Altos Estudos da UFRJ (CBAE) desde 2012. Era pesquisadora de nível 1 do CNPq.

Fez mestrado (1971-76) e doutorado (1979-1986) no Museu Nacional (Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, PPGAS). Fez pós-doutorado na Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales de Paris em 1992.

Nascida em Santa Fé, Argentina, foi graduada em História pela Universidade Nacional de Córdoba. Ali foi professora entre 1973 e 1975, ano em que foi expulsa da universidade com mais 150 colegas e no ano seguinte se refugiou no Brasil, escapando ao início do terrorismo de estado naquele país que se prolongou até 1983. Foi acolhida no grupo de pesquisa sobre campesinato no PPGAS do Museu Nacional entre 1976 e 1978. Em seguida fez concurso para o IFCS. Naturalizou-se brasileira e tinha assim uma cultura bi-nacional que por sinal muito contribuiu para o intercâmbio entre a Argentina e o Brasil na área de Antropologia. Ajudou na formação de muitos colegas argentinos que para cá vieram estudar num momento em que a pós-graduação na Argentina ia sendo retomada desde 1986.

Suas linhas de pesquisa se referiam à antropologia do campesinato e da família, à antropologia da política, do meio ambiente e dos movimentos sociais. Tinha diversos livros de sua autoria e de co-autoria nesses temas. Foi nos últimos anos coordenadora do Programa de Memória dos Movimentos Sociais (Memov) do CBAE-UFRJ que ajudou a fundar.

O Consuni vem assim se solidarizar junto a seus familiares, aos seus colegas e amigos e, em especial, à sua filha e ao seu filho.

Consuni-UFRJ, 11 de outubro de 2018.

 

CBAE abre seleção de bolsistas para projeto

 
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O Colégio Brasileiro de Altos Estudos está com inscrições abertas para candidatas e candidatos à bolsas do seu projeto de Consolidação do CBAE, para início em novembro de 2018, via convênio com a Coppetec. As inscrições foram adiadas até o dia 14/10/2018 e pode ser realizada pelo email cbae@forum.ufrj.br, com assunto “Seleção de bolsista” e enviando currículo (de preferência Currículo Lattes) e contato (email e telefone). Confira as bolsas ofertadas:
 
1) Bolsa de Iniciação Científica em Comunicação Científica
Perfil: Estudantes de Graduação da UFRJ em Comunicação Social e afins; preferencialmente ter conhecimento em softwares de edição, filmagem e fotografia
Horário: 20h
Valor da Bolsa: R$ 700,00
Duração: 6 meses, renováveis mais 3 vezes por igual período
Atividades: Apoio à divulgação científica das atividades dos programas do CBAE
 
2) Bolsa de Desenvolvimento Tecnológico
Perfil: Graduado em Ciências Humanas com experiência de 2 anos em pesquisa após graduação; preferencialmente ter conhecimento sobre trabalho arquivístico e pesquisa sobre movimentos sociais
Horário: 30h
Valor da Bolsa: R$ 3.000,00
Duração: 6 meses, renováveis mais 3 vezes por igual período
Atividades: Atividades do Programa de Memória dos Movimentos Sociais – Memov, principalmente as atividades arquivísticas
 
3) Bolsa de Pós-Doutorado
Perfil: Doutor em áreas de Ciências Sociais, História e afins, preferencialmente com experiência em pesquisa sobre movimentos sociais
Horário: 40h
Valor da Bolsa: R$ 4.200,00
Duração: 6 meses, renováveis mais 2 vezes por igual período
Atividades: Atividades do Programa de Memória dos Movimentos Sociais – Memov, principalmente no projeto de pesquisa “Análise comparativa dos ciclos de greves iniciados pelos metalúrgicos de São Paulo e do ABC paulista e pelos canavieiros de Pernambuco no final dos anos 70”

 

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CBAE vai colaborar na reconfiguração do acervo do Museu Nacional

 

O Colégio Brasileiro de Altos Estudos se comprometeu em participar do Grupo de Reconfiguração do Arquivo Histórico do Museu Nacional, em reunião realizada ontem (12). Iniciativa da Seção de Memória e Arquivo (SEMEAR) do Museu Nacional, o grupo também conta com integrantes da FIOCRUZ, do IBICT, do Arquivo Nacional e do Sistema de Arquivos (SIARQ) da UFRJ.

Como reafirmado em nota recente, o CBAE tem atuação muito ligada à memória da pesquisa acadêmica. O Programa de Memória dos Movimentos Sociais (Memov) do CBAE trabalha com parte do acervo de pesquisadores do Museu Nacional e do SEMEAR.

O acervo físico do SEMEAR era um acervo riquíssimo para a história da ciência, das diversas disciplinas, e também para a própria história do Brasil. Além dos importantes acervos de pesquisas e de pesquisadores, e dos institucionais, o arquivo contava com preciosidades como uma coleção de fotografias de Marc Ferrez e o conjunto de material mais robusto sobre a pesquisadora brasileira e feminista Bertha Lutz. Uma das principais lutadoras pelo voto feminino no Brasil, possui relevantes contribuições na área de anfíbios. Este material arquivístico, inclusive, concorre como Registro da Memória do Mundo, da UNESCO, em conjunto com outros arquivos brasileiros.

A missão desse grupo é formar uma força tarefa para fazer um levantamento do que foi perdido – entre materiais de pesquisa, documentos institucionais, acervos de pesquisadores – e buscar reconstituir o que for possível, como uma representação do que foi o arquivo físico da SEMEAR. Esse trabalho perpassa pelo resgate de cópias dos documentos originais que tenham os diversos cientistas que utilizaram o acervo do Museu Nacional para suas pesquisas e o tratamento dos documentos digitais, para sua publicização na plataforma Mnemosine da UFRJ. Os desafios são grandes em realizar essa missão para a qual serão necessários não apenas esforços de trabalho, mas recursos estruturais.

José Sergio Leite Lopes, diretor do CBAE e professor da Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional, acredita que a atuação desse grupo é muito importante para a ciência no Brasil. “Essa iniciativa envolve o trabalho e o engajamento pessoal de diferentes especialistas em um contexto interinstitucional de forte solidariedade com o incêndio ocorrido no Museu Nacional”, afirmou o antropólogo.

 

CBAE Museu

Grupo de Reconfiguração do Arquivo Histórico do Museu Nacional se reuniu na manhã dessa quarta-feira.

 

Nota do Colégio Brasileiro de Altos Estudos sobre o incêndio do Museu

 

O Colégio Brasileiro de Altos Estudos da UFRJ (CBAE/UFRJ) vem se somar ao grande pesar pelo incêndio do Museu Nacional, ocorrido no último domingo (02/09), e prestar solidariedade a todos aqueles da comunidade acadêmica da UFRJ que ali atuam, especialmente aos seus servidores – técnicos e professores – e estudantes. O CBAE/UFRJ, órgão parceiro do Museu, e como este, órgão suplementar do Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, se ressente em suas atividades cotidianas da perda física do vasto material museológico, arquivístico, de pesquisa, bibliográfico e da estrutura que dava suporte ao trabalho acadêmico ali desenvolvido – perda esta que traz enorme prejuízo ao projeto educacional de transformação da realidade social desmesuradamente desigual desse país em termos escolares e culturais.

O Colégio tem como linha de trabalho a construção da memória sobre a pesquisa acadêmica. Com esta finalidade, um de seus programas, o de Memória dos Movimentos Sociais (Memov), concentrou seu foco de atenção nos materiais acumulados na linha de pesquisa “Campesinato e classes trabalhadoras”, uma fração da diversidade de linhas no interior do Museu Nacional. E tem assim parceria com esta instituição, através de professores, professoras e laboratórios do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS/MN) e com a Seção de Memória e Arquivo (SEMEAR/MN), para atividades de cooperação na construção de acervo digital no interior do sistema de arquivos da UFRJ.

Instituição bicentenária e anterior à universidade, criada no Império como museu de história natural, foi durante os períodos seguintes da República que o Museu Nacional se tornou cientificamente cada vez mais respeitável em relação ao conhecimento do seu tempo. Já então nas instalações do antigo Paço Imperial de São Cristóvão, destinado a abrigar o museu antes instalado em outro prédio, sua atividade museológica se vinculou a este palácio histórico. A incorporação à antiga Universidade do Brasil em 1946 propiciou 32 anos depois o início de uma nova etapa do seu prestígio científico. Ao fundar sua primeira pós-graduação em 1968 logo após a reforma universitária que se deu no ano anterior, a de Antropologia Social, ela se tornou uma experiência de referência no interior da UFRJ e para outras universidades no país e reconhecida no plano internacional. Nas décadas seguintes os antigos setores do Museu nas áreas de botânica, zoologia e geociências também converteram seu prestígio anterior sob a forma de programas de pós-graduação que alcançam hoje níveis de excelência. O MN possui seis programas de pós-graduação stricto sensu (Antropologia Social, Arqueologia, Botânica, Linguística e Línguas Indígenas, Zoologia e Geociências) e três cursos de pós-graduação lato sensu (Geologia do Quartenário, Gramática Gerativa e Estudos de Cognição, Línguas Indígenas Brasileiras), além de vários laboratórios e núcleos de pesquisa, confirmando-o como um dos mais importantes centros de pesquisa, ensino, e de atividades de extensão museológicas, arquivísticas e de integração com a educação básica do país.

Essa característica do Museu Nacional, da mais óbvia integração e indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, princípio da atividade educacional universitária pública no Brasil, evidencia a importância da sua existência no seio da UFRJ. Ao contrário das narrativas que querem esvaziar a universidade da referida indissociabilidade, o Museu Nacional não construiu sua importância apesar da UFRJ, mas com a UFRJ, por estar imbuído dos mesmos princípios construídos publicamente para a educação universitária brasileira. Com sua atividade centenária de trabalho de campo, de guarda e de exposição de acervos e de recepção de escolas do ensino fundamental, com o projeto pioneiro de radio educativa pública de um de seus pesquisadores, o Museu Nacional se antecipou de certa forma às atividades de pesquisa e extensão que hoje florescem em vários setores da UFRJ, e que o revigoram de volta. Em particular, consoante com o processo histórico da entrada mais massiva de estudantes das classes populares na universidade nas últimas décadas, e com sua experiência no envolvimento com as práticas educativas dos povos indígenas, o PPGAS/MN introduziu pioneiramente ações afirmativas dirigidas a alunos afrodescendentes e indígenas na pós-graduação da UFRJ, além de sua atenção aos critérios socioeconômicos no atendimento ao corpo discente.

Assim como a universidade em seu conjunto, o Museu Nacional sofreu sempre com orçamentos insuficientes. Relatos e documentos das gestões presentes e passadas do Museu demonstram as diversas iniciativas já tomadas em busca de recursos – junto ao orçamento da educação, da cultura, de emendas parlamentares e fomentos de instituições brasileiras, internacionais e privadas, a grande maioria das vezes frustradas ou insuficientes para a manutenção de sua infraestrutura. Mesmo com recursos extras – para reformas e projetos – é o orçamento anual, sem contingenciamento, que permite que uma universidade ou qualquer órgão público faça sua gestão adequadamente. A UFRJ, como se pode verificar nas notas oficiais da reitoria e de seus gestores ao longo de décadas, sempre teve um orçamento insuficiente para o tamanho e o conjunto das suas atividades. Mas nos últimos quatro anos tem sofrido cortes drásticos, privando o acesso aos recursos básicos à sua atividade, como a regularidade no fornecimento de energia elétrica e da rede de informática, serviços de limpeza e vigilância. É esse contexto que deve ser trazido à tona para a compreensão da tragédia do domingo de 2 de setembro: os recursos para a educação, ciência & tecnologia e cultura são insuficientes e estão sofrendo cada vez mais com os cortes impostos pela Emenda Constitucional 95, conhecida como a do “Teto dos Gastos”, emenda já denunciada pela nossa comunidade acadêmica e por entidades como a Academia Brasileira de Ciência e a SBPC. As tentativas de manipular as informações sobre o funcionamento do orçamento público, desacreditar a democracia universitária na escolha de seus dirigentes, diminuir o papel dos servidores públicos e as iniciativas das gestões universitárias, só podem ser compreendidas como estratégias dos inimigos do projeto educacional público e democrático no país. Projeto este que tem dentre suas metas a transformação da realidade social e o desenvolvimento nacional com respeito à natureza e através da educação e afirmação da riqueza da diversidade cultural.

A memória de um povo, a sistematização de seu conhecimento e sua divulgação ao conjunto da população são imprescindíveis para a produção das condições de possibilidade das transformações em favor da diminuição da absurda desigualdade escolar e cultural da nossa sociedade.
O CBAE de sua parte continuará empenhado em recuperar os documentos, imagens e depoimentos da linha de pesquisa e do setor de memória com que tem parceria no Museu Nacional, de imediato junto à rede de laboratórios de pesquisa de diversas universidades com que colabora e também junto a instituições e entidades de movimentos sociais. 
O CBAE se mostra coeso junto aos corpos representativos de todos os setores da UFRJ e de sua reitoria, junto à associação nacional de reitores das universidades federais e de toda a comunidade acadêmica na reconstrução do Museu Nacional. E com eles permanece vigilante quanto a retóricas de mudanças de estruturas jurídicas que disfarçam interesses econômicos e midiáticos nocivos à ciência e à cultura nacionais, assim como a práticas persecutórias de setores de órgãos de controle judiciário neste momento de ataque às universidades públicas. O CBAE é assim parte da corrente de solidariedade surgida em resposta à tragédia, energia essencial ao trabalho de reconstrução material e simbólica do Museu Nacional e ao mesmo tempo de resistência da UFRJ.

 

Colégio Brasileiro de Altos Estudos,

09 de setembro de 2018

 

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Museu Nacional na manhã após o incêncio. Foto: José Sergio Leite Lopes/CBAE

 

Martinho da Vila recebe título de doutor honoris causa da UFRJ

 

2017.11.31 Martinho da Vila

 

O músico e compositor Martinho da Vila recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade Federal do Rio de Janeiro enquanto mediador entre a cultura popular e a erudita. O diretor do CBAE e membro do Conselho Universitário da UFRJ, José Sergio Leite Lopes, foi o responsável pelo parecer no CONSUNI favorável à concessão e considerou o episódio como uma “alegria no mar de iniquidade e gerador de tristeza da política geral atual”.
 
Martinho José Ferreira, nascido na zona rural do Rio de Janeiro, se tornou um expoente da cultura popular através da sua vasta e renomada obra musical no samba. Com os sucessos “Canta Canta, Minha Gente” e “Disritmia” e os samba-enredo que compôs para a Unidos de Vila Isabel, se projetou nacionalmente como músico. Sua atuação, no entanto, também está ligada ao movimento negro e à literatura.
 
Atua há várias décadas na luta contra o racismo e na aproximação do Brasil com a África lusófona, buscando tanto a proximidade diplomática quanto o intercâmbio cultural. Além disso já publicou livros infanto-juvenis e romances.
 
Para o diretor do CBAE, José Sergio Leite Lopes, integrante da Comissão de Ensino e Títulos do CONSUNI, a concessão desse título é bastante simbólica. “Ele se dá em um período em que a universidade pública vem passando por um processo de integração consistente de discentes das classes populares, através de um processo social mais amplo e através de ações afirmativas”, afirmou. Mas esse processo está agora seriamente ameaçado.
 
No parecer enviado ao CONSUNI, Leite Lopes ainda fez uma comparação do momento atual com o narrado pela canção de Martinho de 1969, “Pequeno Burguês”. Para ele, a canção que mostrava as dificuldades de manutenção e sobrevivência dos estudantes oriundos de classes populares na universidade deve servir de mote e motivação na resistência às tentativas de desmonte da universidade pública.
 
A sessão solene presidida pelo reitor Roberto Leher aconteceu na Faculdade de Letras da UFRJ na tarde do dia 31 de outubro e mobilizou tanto sambistas quanto acadêmicos.

 


 

SEGUE ABAIXO PARECER ELABORADO POR JOSÉ SERGIO LEITE LOPES PARA A COMISSÃO DE ENSINO E TÍTULOS DO CONSUNI:

 

Parecer da Comissão de Ensino e Títulos do CONSUNI da UFRJ para a concessão do título de Doutor Honoris Causa da UFRJ a Martinho da Vila.

 

Conforme resolução do CONSUNI da UFRJ, de 1994, o título de Doutor “Honoris Causa” poderá ser concedido a personalidades nacionais e estrangeiras de alta expressão. Em outro trecho de documento desta universidade é dito que o título é atribuído a uma personalidade de reconhecido saber ou pela atuação em benefício das artes, das ciências, da filosofia, das letras ou da melhor convivência entre os povos. Embora a trajetória biográfica de Martinho da Vila seja diferente daquela da imensa maioria da lista de 337 nomes de títulos desta modalidade concedidos pela UFRJ ao longo de sua história até março deste ano, ela no entanto atende aos requisitos acima citados. A concessão do título é um indicador dos critérios de privilegiamento que a universidade quer atribuir a personalidades que têm determinadas qualidades; ser dirigente de tal país, ser autoridade de tal ou qual instituição nacional; ser profissional de tal área disciplinar. Atribuir o titulo a uma personalidade que se distingue por ser um expoente da cultura popular, por sua militância contra o racismo e pela promoção da população afro-brasileira, bem como na aproximação entre o Brasil e a África lusófona, é um ato significativo da universidade dos dias de hoje, que almeja a diversidade e a inclusão em um ambiente recentemente tornado hostil.

 

O pedido de concessão do título de Doutor Honoris Causa ao compositor, cantor e escritor Martinho da Vila tem origem no Departamento de Letras Vernáculas da Faculdade de Letras da UFRJ através de requerimento assinado pela chefe de departamento, Profa. Mônica Genelhu Fagundes. Pelo Departamento o parecer (intitulado “Justificativa Detalhada”) foi dado pela Professora Titular de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa, Carmen Lúcia Tindó Secco. Pela Congregação da Faculdade de Letras deram pareceres os Professores Titulares Godofredo de Oliveira Neto e João Baptista de Medeiros Vargens.  Todos pareceres circunstanciados favoráveis e aprovados por unanimidade. No Centro de Letras e Artes o parecer favorável foi dado pela professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Maria Julia de Oliveira Santos e aprovado pelo Conselho de Coordenação do Centro de Letras e Artes. O processo também contém um memorial de próprio punho do homenageado.

 

Nos citados pareceres anteriores na Faculdade de Letras e no CLA já foram realçadas as qualidades de Martinho da Vila que justificam a concessão do título:

 

– por ser um compositor de vasta e renomada obra musical de cultura popular;

– por ser um escritor de literatura infanto-juvenil e de romances;

– por sua importância na luta contra o racismo e na promoção das populações afrodescendentes brasileiras;

– por sua atuação há várias décadas como embaixador informal na relação entre o Brasil e a África lusófona;

– por ser um promotor constante da aproximação entre músicos africanos lusófonos e músicos brasileiros.

– e, em consequência disto, ter sido objeto de várias teses acadêmicas e ter sido conferencista convidado por diversos setores da própria UFRJ, evidenciando implicitamente um notório saber.

 

Martinho da Vila é assim um personagem que por sua trajetória tornou-se um mediador entre a cultura popular e a erudita, por suas qualidades bi-culturais de mestre popular e de ídolo da indústria cultural, o que potencializou sua atuação na promoção da cultura popular e na militância contra o racismo na sociedade brasileira. E ao mesmo tempo alargou seu raio de ação à aproximação da cultura popular brasileira com a da África lusófona desde as lutas anticoloniais ali travadas, tornando-se uma referência desta aproximação.

 

Gostaria de destacar o simbolismo específico na concessão desse título ao renomado compositor que tem uma trajetória originária do mundo rural fluminense serrano, que passa pelos bairros populares cariocas, até sua profissionalização na cultura popular e na indústria cultural. O episódio da compra da fazenda em que seus pais e antepassados trabalharam no município de Duas Barras e sua transformação em centro cultural de guarda de seu acervo de artista popular famoso já mostra a potencialidade de inversão das hierarquias sociais que tem a trajetória de Martinho da Vila.

 

Este simbolismo é tanto maior quanto a concessão deste título se dá num período em que a universidade pública vem passando nos últimos anos por um processo de integração consistente de discentes das classes populares, através de um processo social mais amplo e através de ações afirmativas beneficiando alunos oriundos da escola pública e em particular de alunos afrodescendentes (e indígenas em certas áreas da universidade).

 

O grande sucesso de uma das canções de seu álbum de 1969, a canção “Pequeno Burguês”, é uma crônica fina e perspicaz da brecha ambígua surgida então para indivíduos das classes populares terem acesso à universidade particular.

 

Tratava-se nesta canção da análise de algumas das consequências do processo social desencadeado pelas autoridades do regime militar de absorverem os chamados “excedentes” dos vestibulares das universidades públicas – questão que estava no centro do mal-estar estudantil que desencadeou o movimento de 1968 – através do estímulo ao crescimento das universidades particulares.

 

Mas a canção mostrava as dificuldades de manutenção e sobrevivência desses discentes no curso universitário, decorrentes dos valores das mensalidades, do ensino noturno após o trabalho, da defasagem temporal do ciclo de vida estudantil usual que fazia frequente a necessidade de manutenção de filhos por parte destes alunos, fatores que somados dificultavam ao extremo as condições materiais de estudo desses indivíduos em busca de oportunidades de ascensão social.

 

A crítica irônica da canção serve profeticamente de alerta para as consequências da crise do processo de ascensão social pelo sistema escolar dos últimos anos que tanto bem vinha fazendo à vida universitária, crise provocada deliberadamente pelo ataque de um governo ilegítimo sustentado de forma irresponsável pelas elites do poder econômico e pela estreiteza pseudocientífica da parte dominante dos economistas.

 

A concessão do título de doutor honoris causa da UFRJ a Martinho da Vila, em decorrência de seus méritos intelectuais e culturais intrínsecos, não deixa de ser um reconhecimento da universidade pública de qualidade ao autor da canção que auto-ironizava sua difícil entrada na universidade privada. E que a UFRJ se aproprie da crítica implícita na canção e que ela sirva de mote e motivação na resistência às tentativas de desmonte da universidade pública no momento mesmo em que ela passava a incluir de forma crescente estudantes oriundos das classes populares, das maiorias dominadas e das minorias étnicas, necessários à alta qualidade universitária provocada pela simples inclusão da maior diversidade.  

 

Parabéns à Faculdade de Letras da UFRJ pela iniciativa, parabéns a Martinho José Ferreira, Martinho da Vila, como novo doutor-honoris causa da UFRJ.

Agosto de 2017,

 

José Sergio Leite Lopes

(Conselheiro representando o Fórum de Ciência e Cultura)